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domingo, 10 de maio de 2009

ANGU DE SANGUE

por Fernando Gil Paiva



O Palco Giratório de ontem, no Sesc Arsenal, apresentou a peça ANGU DE SANGUE, do grupo Coletivo Angu de Teatro de Pernambuco que já está junto há cinco anos. O espetáculo Angu de Sangue foi o primeiro e o grupo já conta com três peças. O nome tanto do grupo quanto da peça vem da obra do autor pernambucano Marcelino Freire. O texto que os atores trabalham em cena é a versão integral sem nenhum modificação da compilação literária do autor.

São várias histórias de personagens que mostra uma sociedade nua, sem lentes desfocadas ou véus que degradam a visão do real. São moradores de um lixão, mães que são movidas pela entrega de seus filhos, atos sobre o homossexualismo, discursos by Tio Sam na voz da pedicure que imita a americana cheia de si. A menina Socorrinho que sofre violência sexual e é embalada pela canção trágica de sua própria vida... Intepretada por uma parte do livro em que o autor elimina qualquer pontuação senão as vírgulas...
No final do espetáculo, os personagens se sentaram com o público para responder a perguntas. O duelo entre aqueles que riram de algo tão sério e aqueles que por falta de maiores moções apenas riram.

Uma das espectadoras pontuou que não se trata de ser apelativo, mas sim, cru. Pode-se muito bem ser cru e verdadeiro sem ser apelativo. E assim também concordo. A peça induzia ao cômico, de tão trágica que era, mas certos risos apenas se perdiam nas cenas de um fio de sangue que escorria ou de uma criança que se perdia no mundo, de uma mãe que pretendia dar seu filho ou de uma moradora de lixão que vivia numa geladeira abandonada...

"Moço não, sua mãe, suando, grito no semáforo, em contramão, suada, pelos carros, sobre os carros, carros, moço, não, viu sua mãe e a cidade, nervosa, avançando o meio-dia, dia de calor, calor enorme, ninguém que avista, Socorrinho, algumas buzinas, céu de gasolina, ozônio, cheiro de álcool, moço, não, parecido sonho ruim , dor de dente, comprimido, pernilongo, extração de ouvido, o ônibus elétrico, esquinas em choque, paralelepípedos, viagens que não conhece - hoje desaparecida menina de seis anos, ou sete, trajada de camiseta, sapatinhos ou chinelos, fita crespa no cabelo, azul forte ou infinito, moço, não, aquele grito franzino, miúdo, a polícia que alega estupro, magia negra, sequestro, mastiga um fósforo, a mãe de Socorrinho acende velas, incensos, chorando a Deus justiça divina, justiça duvidosa, viver agora o que seria se já não era, por um descuido já se foi um dia sem ela, dois, Socorrinho, céus e preces, moço, não..."

Trecho de Angu de Sangue, de Marcelino Freire.

Aquele que ri está também fazendo da sua risada o mesmo véu ou lente que desfoca. Se o riso é emissão de som, faz com que dois sons ou mais se misturem e pode ser que nenhum dos dois ou mais seja por todos completamente ou por si mesmos compreendidos. Se silenciam e/ou permanecem, fica a fala única e uníssona daquilo que é cru e está nu para ser (sem)ruídos ouvidos.
Nas crônicas do real, nessas crônicas do real, a versão da função da crônica pelo escritor paulistano Lourenço Diaféria "é explodir, é não deixar a peteca cair, é acordar as pessoas que estão dormindo de olho aberto, e gritar".

domingo, 3 de maio de 2009

Começou a girar...

por Fernando Gil Paiva

Ontem tive a oportunidade de ir ao recomeço do festival Palco Giratório no Sesc Arsenal de Cuiabá, um período de um mês de peças de todo o Brasil que já tenho a oportunidade de acompanhar pelo terceiro ano e que só tem me agradado.

A primeira vez foi totalmente por acaso, e por pouco não perdi o espetáculo Viagem ao Centro da Terra da Cia. Teatro Artesanal do RJ, que tanto me agradou. Porque Julio Verne foi o primeiro grande autor que eu li e coincidentemente esse mesmo livro. Lembro de ir à biblioteca, olhar aquele livro antigo e de quase 300 páginas. Eu perguntava a mim mesmo se iria conseguir ler tudo aquilo.

Já o espetáculo foi ótimo, com os atores se trocando ali no palco, na frente do público, interação de bonecos, projeções em meios audiovisuais, um pouco de teatro de sombras e mais, muito mais já que o enredo permitia.

No ano passado, a que mais me marcou foi a peça "O pupilo quer ser tutor" que tem como característica principal o silêncio. Dois personagens, apenas com seus olhares, gestos e posição de palco, guiaram a história por mais de 50 minutos... Mais uma vez, o teatro das novas explorações, que a mim muito agrada.

O pupilo quer ser tutor. Na imagem, o tutor.

No recomeço do ciclo, tenho boas espectativas para esse ano. A primeira foi "100 Shakespeare", da Companhia Pia Fraus, de São Paulo. Confesso que depois de ter visto, fiquei com vontade de ter conhecido mais Shakespeare antes de ter ido à peça. Mesmo assim, tudo foi muito proveitoso, já que a estética da peça, os diferentes recursos para os 43 bonecos manipulados pelos 4 atores em palco, mais cenas de luz negra, lanternas, estiveram em boa sintonia. Os bonecos eram bem diferentes, tanto no que diz respeito ao tamanho, quanto à forma e aos meios de interação com seu manipulador. Mais um ponto aqui!

No decorrer da peça, os personagens mais marcantes de Shakespeare iam se delineando sem contar ao público quem era quem. Com isso, já ficava aquela ponta de tributo a cada um deles. É por isso que disse que eu quis conhecer todos eles ou grande parte deles, pois poderia ter sido algo realmente interessante o fato de identificar as subjetividades da peça. E esse fator acho que foi um tanto quanto presente. Mas a própria intenção da peça acredito que tenha sido esse, de gerar novas e múltiplas interpretações seja para o conhecido ou para o desconhecido!

Cena de "100 Shakespeare"

Depois, resolvi entrar no site da companhia Pia Fraus e lá encontrei mais sobre minhas curiosidades shakesperianas...

Trecho do release do site:
Apesar da grande beleza dos textos shakespearianos e da força de seus versos, a opção por suprimi-los trouxe à tona, de uma forma totalmente imagética, a riqueza humana de suas obras. Aprofundando-se em seus personagens é possível reconhecer seus medos, desejos, paixões; sentimentos que existem em cada um de nós e que compõem a figura humana. Percebe – se que Shakespeare vai muito além do retrato de uma época: ele disseca o homem em sua essência.Nessa motivação foram criadas “cenas sínteses”, selecionadas de nove peças do dramaturgo inglês: Hamlet, O Mercador de Veneza, Romeu e Julieta, Macbeth, Otelo, Sonho de uma noite de Verão, Rei Lear, Ricardo III e Titus Andrônicus. Releituras muitas vezes bem - humoradas feitas a partir das impressões pessoais de cada um que ajudou a criar essa montagem, e que propõem um ponto - de - vista muito particular sobre cada texto.O espetáculo é realizado em espaços pequenos e com uma iluminação que cria uma atmosfera intimista, aproximando o público dessas sensações e convidando - o a enxergar além das peças escolhidas, tornando - o mais um nessa releitura das “emoções Shakespearianas”.

Cena de "100 Shakespeare"