sábado, 8 de janeiro de 2011

Sob a influência do "perigo de uma história única"

Desde agosto, quando ouvi o nome da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, não paro de constatar o poder de sua fala na palestra hospedada no TED que sugere um olhar mais profundo e, no mínimo, múltiplo de um determinado assunto. A história única, para Adichie, é tudo aquilo que se resumo ao supra sumo do que achamos que sabemos sobre alguma coisa. É como falarmos da Índia e rapidamente lembrarmos só de Gandhi e do Ganga (o Ganges), ou falarmos da culinária portuguesa e resumimo-la aos pastéis de Belém e ao bacalhau etc etc. Não incorrer no perigo de uma história única é ter a extrema sensibilidade e perspicácia de ir além daquilo que está no fácil e rápido acesso.


Na década de 60, o ainda apenas ator Richard Attenborough (o dono do Jurassic Park, para não falhar a memória) recebeu um telefone inesperado que o colocou diante da biografia de Gandhi. Ele, sendo apenas ator e sem ter contato absoluto com a arte da direção, foi colocado diante do convite de mergulhar na vida do Bapu (pai) da Índia e começar, do zero, sem incentivos e sem dinheiro, a produção do filme que "ainda habitando em sonho" seria realizado não se tinha ideia quando.

O perigo da história única sobre a Índia começou ainda mais a desmoronar quando assisti ao belo trabalho contido nos extras de GANDHI (direção de Richard Attenborough, ganhador de 8 Oscar, edição de colecionador), o que inclui um making of e uma série de entrevistas com o diretor e atores. Para aqueles que gostam e se interessam por Gandhi e que expandem esse gosto pela cultura indiana, digo que foi tarde o dia em que me dediquei às três horas e dez minutos do filme, pensando que poderia tê-lo feito tanto antes sabendo que o DVD estivera na minha prateleira por quase dois anos. Mas minhas teorias sobre a espera argumentam sobre o amadurecimento de uma obra de arte. É como se ela ficasse melhor com o passar do tempo. Mas, enfim, deste modo, mergulhado e seduzido ainda mais por este país, não contive momentos em que me questionei tamanha fidelização de um trabalho inspirado pela vida real. Assim como já havia lido que Mario Cotillard foi o mais impressionante mergulho em um peronsagem baseado em uma pessoa, no caso, Edit Piaf, digo que Ben Kingsley, estando apenas em seu primeiro filme e tendo antes apenas atuado nos palcos do teatro, conseguiu o feito para se equiparar ao impressinante mergulho, mas para um trabalho masculino. 

Ver Kinglsey foi como ver Gandhi se estendendo na dor e luta de sua vida, no amor e na sabedoria suprema que sempre o levava a tomar as decisões mais corretas e que trariam não apenas para si, mas principalmente para seu povo, o bem estar maior. O próprio povo indiano acreditava estar diante de Gandhi tal a semelhança física de um para com o outro. Fica impossível não dar créditos aos incríveis maquiadores que transformavam um homem de 37 anos num homem com as dores, marcas e curvaturas de seus 78 anos. Não foi à toa que Mohandas K. Gandhi foi quem foi e é impecável o trabalho de Attenborough e toda sua equipe,  principalmente quando se esvai do perigo de uma história única e ficamos sabendo, indo um pouco além, que durante vinte anos, o futuro diretor de Gandhi passaria procurando meios de executar este que é considerado um dos últimos épicos feitos antes da era do digital em que se tornou possível multiplicar e acrescentar multidões etc etc etc. Fica evidente o envolvimento que parte do micro ao macro e torna tudo isso uma conjunto sem defeitos. Desde o cudiado com a fotografia, o figurino e a medida certa do amor desse povo para com a história que se contava. 


Gandhi (o filme), infelizmente, na época, não conquistou muito dos possíveis produtores e patrocinadores da indústria cinematográfica e teve que ser rodado com apoio da iniciativa privada e também do governo indiano, que abraçou de imediato a realização do filme. Ter tido o conhecimento da mudança de hábito de Ben Kingsley, bem como sua dieta que passou a se assemelhar a de Gandhi, todo o enorme aparato reunido para fazer daquele momento algo para se tornar inesquecível, parece ter conquistado todos aqueles que ficaram até o último instante, sem nenhum prejuízo, desta obra memorável. E feliz, agradeço por ainda ter a chance de descobrir muita coisa que eu nem imaginava. Sair de histórias únicas ou nem tão únicas histórias e ter o conhecimento de todo um universo ao meu redor de um filme que nunca começa quando colocamos o dvd no aparelho, mas que começou, nesse caso, na década de 60, um filme que começou há 50 anos e que hoje, em 2011, ainda mantemo-nos boquiabertos com tamanho tamanho. Sim! Eu o veria muitas e muitas outras vezes, como me conquistou este que passa a figurar na lista dos meus favoritos. 

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