quinta-feira, 11 de junho de 2009

Perfil Jornalístico

EM BUSCA DA TERRA DO NUNCA


por Fernando Gil Paiva

Todas as vezes que uma criança diz: “Não acredito em fadas”, uma pequena fada cai morta em algum lugar.

James Matthew Barrie


Do início das palavras de Géssica, logo poderia se prever que essa personagem mais que real estaria tão próxima do menino Peter Pan, imortalizado pelo escritor escocês James Matthew Barrie a partir de 1904, quando foi criado. Para Géssica, estar na Terra do Nunca era viver sem ter grandes preocupações – insira aqui o crescer – ou em quem se espelhar como ídolo/objeto de veneração.

A filha única e sua inseparável cadela Dolly viviam alheias em um mundo que as tirava da aparente solidão em volta e também de seus problemas. E quando vinham as dificuldades, a mãe logo pedia que a menina fizesse uma oração. Géssica, entretanto, nunca tivera uma religião formada, sua mãe também não e ambas sabiam muito bem disso. Assim, era fácil, a partir das “orações”, lembrar de certas situações de perigo. Como quando um desgovernado balanço atingiu a criança desatenta na escola, ou quando o ladrão ousado tentou roubar seu casaco – com ela dentro dele! Nesses momentos era como se ela não quisesse estar lá, queria fugir.

E fugiu. Géssica partiu para uma de suas primeiras visitas à sua Terra do Nunca, onde “todas as crianças, exceto uma, crescem”. Tudo aconteceu quando ela decidiu partir para casa de uma de suas únicas amigas, Tarsila, e lá ela ficou até sua mãe ir buscá-la, o que não demorou muito. A Terra do Nunca não se caracterizava por um ponto fixo, mas nos lugares onde Géssica sentia a segurança de não ter em mente os delírios da realidade.

Agora mais uma fuga. Porém, não de casa e não tão drástica. A nova Terra era uma casa abandonada que servia de abrigo para animais igualmente abandonados que Géssica e alguns poucos amigos interessados na causa cuidavam. Nesse breve período, passaram por lá três gatos, dois cachorros e uma coruja – os Garotos Perdidos de Peter Pan – que tiveram apoio físico (e por que não psicológico?) até que a casa fosse alugada. Essas constantes fugas ao Nunca pareciam, em contrapartida, levar Gésssica de volta ao seu mundo real, fosse a mãe que a buscava ou um fato que a interrompia. E foi fora do imaginário que a mãe de Géssica, acompanhada da filha e saindo um dia da casa de Tarsila – a Wendy da história – perdeu o controle de sua moto e as duas foram lançadas ao chão após um choque contra o poste. Nesse momento, quando a união ficou mais instável, veio a certeza de ambas estarem no mesmo lugar e compartilharem os mesmos territórios. Uma dependia da outra e seria sempre assim.

O passar dos anos a fez sair de casa em definitivo e agora adquiria novos talentos vivendo sua liberdade longe de sua mãe, não dos olhos dela. Ela podia ser, então, quem quisesse quando quisesse. A menina inteligente e dotada de ganchos a fez também o Capitão, capaz de bem dosar suas palavras, fossem escritas ou faladas. A mágica da ironia, da versatilidade e rapidez em construir o genuíno fez com que seus recentes amigos da universidade passassem a reconhecer seus encantamentos.

Mas as coisas não são sempre assim e, para Géssica, sentir a si mesma com tanta intensidade é de sua constituição. Hoje, ser como Peter Pan e manter-se criança faz parte; bem como ser Sininho e poder ir, por quanto tempo quiser, para as partes mais distantes do Nunca sem ter resistências; e possuir o inevitável e paradoxal gancho que fica cutucando por dentro seu corpo dizendo que quer sair e odeia viver na Terra do Nunca e ser Peter Pan. Cada etapa a seu tempo, ou todas de uma só vez.

Então, ela percebe que chega a hora de voltar a ser a menina jornalista / economista que corre contra o tempo para cumprir a agenda que – literalmente - carrega sua vida (e que não tirem essa agenda sob pena de morte, a dela, é claro). Quanto ao Nunca, esse fica como um lugar a ser repensado. Algumas coisas entraram para a lista daquilo que já é uma possibilidade, mas sem se esquecer daquilo que já lhe pertence. Separar o mundo real do imaginário é algo muito difícil para ser imposto numa vida tão flexível. Por mais que novos caminhos sejam traçados, a visita dos inesperados não podem ser negada. Inesperados amigos, personagens, ‘eus’ que aparecerem.

O sino tocou. Dolly está latindo lá de sua casa. Géssica resolve chamar Tarsila para voltarem mais uma vez ao Nunca e se divertirem com seus fantasmas. Ela sabe que não está mais sozinha e sente de volta seu ‘eu’ original, o que sempre esteve presente, mesmo não estando aqui no real.

“Qual o seu nome? Ele perguntou”. Géssica, ela disse, sentindo-se de volta.


James Matthew Barrie foi jornalista, escritor e dramaturgo de histórias infantis. Peter Pan surgiu pela primeira vez em O menino que não queria crescer, criado na década de 10 do século XX. Sua principal característica possibilitou interpretações do comportamento humano, como a síndrome de Peter Pan, que justifica a fixação pela infância.

2 comentários:

  1. Acabei de fazer uma viagem ...Existe uma criança dentro de nós!!!!
    Vamos dar uma voltinha sempre no Nunca né!! rsrs

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  2. ok
    eu li esse post
    e simplesmente
    morri de inveja da geh
    qro um post
    tão lindo qnt esse pra mim
    kkk
    ofercida nda :p

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